sábado, 14 de agosto de 2010

Fracasso.

Oi, você não atende o celular, é, eu sei, você perdeu o celular, mas eu gosto de ouvir o som do seu telefone tocando, é uma ilusão tão besta, que de repente vou escutar sua voz, sua voz doce, cheia de ternura, mas ele só toca, ele não atende nunca, e eu sei disso, mas continuo te ligando, te ligando, te ligando, e eu sento no chão e choro, choro, choro porque me sinto uma frustrada, por sentir tua voz indiferente, por não ouvir tua voz, por imaginar as cenas mais absurdas possíveis, e eu tento novamente, disco seu número, eufórica, dessa vez você vai atender, e vai rir, falar do seu café, do céu bonito, eu vou rir, falar de poesia, a gente vai desligar, e eu vou sentir teu cheiro, mas não, você não atende, ele só toca, toca, toca, e eu quero que ele toque, porque assim eu me sinto mais próxima de você, do seu corpo, da sua boca, mas é mentira, tudo é mentira, é uma ilusão idiota, e o meu telefone não toca, não toca, ninguém bate na porta, mas eu escuto, eu escuto teus passos, vejo tua sombra bonita, e escuto sua voz, a maçaneta girando, vou até a sala, não tem ninguém, mas eu sinto, eu quero sentir, quero te ver, abre a porta da sala, você tem a chave, me abraça e não fala nada, não me deixa pensar em nada, me beija, me beija, me beija, me segura forte, por favor, não deixa eu escutar os gritos, por favor, não me deixa mentir em silêncio, mas não é você, não tem ninguém, eu sinto teu cheiro, teu corpo, tuas mãos deslizando no meu, por favor, abre a porta do meu quarto, anda com presa, me beija no rosto, quero uma margarida, quero teus beijos, mas não tem ninguém, e eu sento no chão, fumo meu último cigarro lendo o Pessoa que você me deu, desisto, te ligo novamente, e toca, toca, toca, eu quase escuto sua respiração, mas não atende, não atende nunca, nunca, nunca, e eu tento outra vez, tento depois do banho, sei que você vai atender e falar que já está chegando, não, é mentira, mentira, ilusão, frustração plena, ninguém vai chegar, teu telefone não vai atender, então me diz, pelo amor de deus, por que eu não paro? E tento, tento, tento, tento..até você atender...até eu escutar tua voz, mas isso não acontece nunca.
Nunca.
Ana T
Inspirado no conto "Além do Ponto", de Caio Fernando Abreu.

2 comentários:

Anônimo disse...

Eternidade não existe?
Já sou eterno nas tuas palavras...

Brisa disse...

Lindo!