sábado, 11 de abril de 2015

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Às vezes me da uma saudade sem sentido de você.
Não é bem a saudade que é sem sentido.
É o tamanho dela. Dessa saudade. Sabe, Carlos? É de doer o peito, de fazer chorar no ônibus.
Eu já senti isso outras vezes. E como essa, também foi terrível. Tive febre e vomitei todo meu enjôo.
Hoje estou sem febre, só sinto o típico nó e aquela falta de ar que me acompanha desde a infância (quando ainda não nos conhecíamos).
Carlos, o que sera isso? Sera pela tua magreza esquiva? Olhos tontos. Dedos longos e finos. Será pelo nosso tropeçar constante?
É. Só te conto que foi bom (apesar da correria recorrente) te namorar no balcão. mesmo sem você perceber.
Foi gostoso, Carlos.
Ponto e virgula.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

tédio amarrado nas costas. dizia ele destilando sua pouca habilidade em se expressar.
mal conseguia escolher os nomes dos personagens. havia parado de fumar há três meses. e de trepar há 5. casto e com o pulmão limpo. assim que gostava de se apresentar.
um chato, sem dúvida
ainda mantinha um único vício, o de roer compulsivamente as unhas.
mas tal ato não condizia com sua nova imagem de homem saudável, afinal, segundo ele, limpeza também é sinônimo de saúde.
no entanto, fracassou em todas suas tentativas. num mês foram dezenove diferentes experimentos.
esmaltes, cremes, unhas postiças e luvas são alguns dos exemplos.

nada funcionou
ou ele acostumava com o gosto do esmalte, ou arrancava as luvas rapidamente, bem como as unhas postiças. tentou roê-las em vez das suas, mas a textura era diferente.
era um rapaz de texturas.
enquanto mordia uma pele qualquer, percebeu que sua conjugação verbal lhe trazia enjoos

não sabia como se livrar do seu derradeiro vicio.

achava que o problema da escrita piorava conforme o fracasso com suas unhas.



sexta-feira, 4 de outubro de 2013

releitura de uma sexta-feira deslocada

você se casou. mora junto. divide quarto e comida. mas ainda não penso nisso. gastei horas te procurando. horas sentada em frente a uma tela branca. meus olhos ardem. meu cigarro, que eu não tenho, já acabou. fiquei triste. o dia está estranho. parece deslocado perto dos outros. sofro um ano atrasada. te encontrei pela última vez num andar distraído teu corpo leve a perambular por ai tomou um caldo de cana ou foi água de coco? você me disse que agora usa óculos e ainda costura reticências e colchetes. te avistei de relance com o rabo do olho estava em barra de são francisco espírito santo miopia ou será astigmatismo? talvez seja a idade. lembro de me perder pela noite, entre os pequenos bares - daqui a quinze anos, já terei quarenta e cinco. dizia o rapaz, assustado. magro e moreno. fino. não parava. continuei o passo apressado deixei o abraço pra lá te perdi. tão singelo e simples. agora encaro tua ausência atrasada aflita afobada inventada eu manquei, tropecei perdi a hora sentada na calçada roendo o dedo, torcendo o cacho e você ali, na sexta-feira. fiquei triste. acho que já mencionei isso. sai do tom. sai do tom e perdi o tempo. porque ritmo eu nunca tive. e você ali tocando gaita? contei até três desci as escadas, entrei em todas as salas e nada. nada. vocês resolveram morar na cidade em que eu nasci. apartamento, um quarto. talvez dois. mas não rasgo com isso. a minha pele continua intacta. o incomodo é atento ao meu atraso. invento! deixa pra lá, melhor parar com isso. dormi muito durante a tarde, isso me deixa zonza. observo uma rua movimentada. estou fora. você me pergunta o por que. você me pede uma terça. eu não vou. perdi pele. e cachos e sextas. repito o não dito. repito as palavras. atraso. quantas vezes? vejo teus cachos na estação luz. mas me engano. escuto teu nome entre uma dose e outra. um rapaz loiro, tão vivido. tão cansado. simples. ele se apresenta. é você. outro engano. 
hoje eu perdi um amor, mas com um ano de atraso. (que embaraço) quantas cartas, letras e aliterações excessivas. te imagino lendo. mas tua imagem se esfacela e teus parenteses tão bem colocados como tuas vírgulas e pontos e letras que se encaixam e estouram meus tímpanos. teu pedido de sonho tua escrita tão presa em meu corpo e você me pergunta o por que.  e diz que é tão longe e eu te passo meu número e o telefone não toca. hoje é sexta-feira. como tantas. estou atrasada. andava com pressa pois perdi o passo. a bossa nova segue mas meu disco estilhaçou. atentei as mãos entrelaçadas o tornozelo fino da moça a pele branca, e os fios loiros. vocês tão adultos. e eu aos quinze mas com vinte e três. números, de certo, nunca foram meu forte. então deixa pra lá
que como disse o poeta
a vida é assim mesmo.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

contar

                                                                    eu já nem sei seu telefone, baby           

hoje acordei às seis
mas voltei a dormir
levantei, enfim, às
sete
fiz suco de laranja (tarefa de hoje: retirar artigos indefinidos do meu vocabulário)
não te contei
pra que contaria?
o transporte público não me irritou
andei a pé
garoinha típica
de Agosto
ou será de São Paulo?
o frio nessas capitais
e a solidão
eita papinho batido
frio/fria
não te contei
pequenas frases que queremos nos livrar
devolver 
o troco
remexer o bolso
procurar moedas
atos
            esquecidos
perdidos
o dia segue
o espaço cheio
                          de tantas curvas
e eu não te escrevo

o dia segue
seco                            
sem trago                    
na ponta da caneta
que arrasto                 
juntos sons
mas não lhe envio
por que o faria?

a fala me cansa (risos)
outros, outras travessias

                  e contar que tudo o que escrevi está um grande lixo


o tom é agradável                  texto sem ritmo, cacofonia sem vontade

mas não afeta
sinto falta
do que desafina
o coro dos contentes

te contar que está chato                                              
que não há interesse            
                                                
nem fagulha
                     os olhos que antes não piscavam, agora pesam                                                     
nem faísca

por isso fujo                                                                
ou tento                                                                                                                                   
sem muito sucesso
falta, fala, a mesma fala....de ter vontade de pensar... mesmo papo       
me falam dos ratos                                                    
do cientificismo                                                           
maneiras de compreender a realidade                            
antropoide
Aristóteles                                 falar contar a saudade que me acerta tão
que saco                                                                                                            atenta
sinto tanta falta 
pequenas doses
diárias
de saudade
não me interesso

mas por que que contar?
os ratos soltos

ele diz no final
que o importante é provocar
provoca?
o que?
nada
e isso me enlouquece
de tédio



e eu não te conto.

domingo, 4 de agosto de 2013

sílabas entre estações

quando saio de você, penso e (re)penso em mim. me destruo um pouco, me quebro um tanto, vomito outro. eu amo o zigue zague desconexos que teus olhos sussurram. teu tropeço. teu grito que nunca escuto. penso o quanto falo, o quanto posso falar menos, mas acabo por triturar qualquer brisa com esse meu tom tosco e desafinado. sinto um gosto teu na minha boca. te falo demais do meu passado. hoje menos. não quero me desculpar, mas é labirinto. é o que não, mas vai, aquele fio quase invisível que não estoura sabe-se lá por quê.a tosse segue. o quase. quase endoidou. quase trepou. o quase me sufoca - tontura. tortura. torto, troco por um troco qualquer. querer arder na pele cada traço mal feito. lambida. De onde eu te conheço? quando solto dos teus olhos? medo, revolto revolto. entalado. a tua pele come a minha. ora derreto, ora cuspo na mão que antes afaga. ora beijo os olhos, ora deito ao lado. e por pouco não vou embora. penso e engulo qualquer bobagem. 
mais uma dose, é claro que eu tô afim. a noite nunca, nunca, tem fim.

amarelo

O vazio me incomoda. E eu te pergunto, mas que vazio? Ou melhor, qual vazio? Agudo? Não sei, ele responde. Sabe, ontem no metrô eu encostei a cabeça no vidro e pensei na morte. Pensei se vale mesmo a pena toda essa palhaçada. Na hora, a resposta foi não. Apesar do medo de reconhecer. Estava triste. Bem triste. Infeliz. Atravessada por unhas roídas e pequenas peles sangrentas. Estava naquela restaurante opaco. Com todos consumindo sem cessar, com todos buscando pelo tom de voz mais alto para conseguir se expressar. Uma disputa incessante. Eu não falo, mas não pense que é por audácia. A preguiça me consome. As paranóias também. E a comida não desceu bem. Travou na garganta. E você apareceu no meio daquela ladeira. Te achei em Minas Gerais pela segunda vez. te achei não sei faz quanto tempo. Você me olhou me abraçou e ficou perto de mim. E eu me senti tão bem. Tão leve. Respiro. E ontem foi assim também sabe, a sua casa, as escadas e a tua cama. Tão grande e tão cheia da gente. E você fica bêbado muito rápido. E passa suas mãos geladas sobre minha pele fria. aperta meu pescoço com as pontas dos dedos longos e finos. eu olho feio, mas derreto em seguida. Eu quero me sentir bem. Há mal nisso? Quero um balão de ar.
Dormir com você é um lance banal. Sem explicação por hora, quero usar a palavra banal.
Nos mexemos muitos. Inquietos até no sono no sonho. Então acordávamos juntos. E nos mexíamos. Era quase um ritual. Foi um sono forte, gostoso e doce. sonhei com você. estávamos num cômodo de uma casa, talvez esta, e você me aparecia com um pequeno ramalhete de flores amarelas. Um sonho bom.
Estou com sua blusa agora. Ela é azul e preta. Na nossa primeira viagem você a usava. Eu reparei nos traços. Sinto sono. E não te acho na cama agora.

É, ele tem cachos, fecha os olhos com vontade e é a sede que escorre dos dedos. que transborda da pele e para pele. Boca fina, rasgo os lábios que queimam. Às vezes me desconcentro. Me desconcerto com as sílabas daqueles olhos. E de repente numa conversa assim na beira da escada, ele me disse com sede que vale a pena viver. Ele me disse – É terrível. E eu concordei, é mesmo, é terrível. Mas....

terça-feira, 9 de julho de 2013

sorrateiros

Antes eu sempre falava, anunciava mil promessas, que iria, enfim, parar. Que estava enojada de tudo o que escorria de meus dedos, das palavras e consoantes repetitivas.                                                                

Gritava sem parar, declamava as mais distintas saídas de emergência,

                                                 mas todos os dias, algo entornava, quebrava, puro estilhaço,  

vidro maçante no branco da folha
                                                    no preto da letra.

Hoje, o tom é outro, o silêncio ecoa o vazio das promessas, o ritmo destoa quente.                                     Não escuto mais o estalar dos dedos pelas madrugadas frias.

Falamos das mesmas coisas, mas você escolhe nomes tão diferentes.

- eis o problema do mundo! dizia ela, rindo.
Ele a olhou por cima, lábios finos, terno preto - fosse só nomenclatura, um bom lingüista dava cabo em todo esse aborrecimento!

e os dois trataram de voltar a escolher feijões para a sopa