terça-feira, 27 de abril de 2010

Doce Dose Doce.

Preciso do seu rosto
Da sua simetria rouca
Da sua voz arrastada
Da sua roupa rasgada
[...]

Ana T. [?]





quinta-feira, 22 de abril de 2010

Relatividade?

Ela com febre, a voz já não existia mais, os olhares falavam sem pudores, o sorriso não conseguia sair dos lábios.
Já que eles não conseguiam se encontrar na realidade, inventaram uma dimensão própria, paralela e pouco conhecida.
A febre continuava, o medo e o nó na garganta pairaram entre os corpos dos nossos personagens, mas era preciso uma dose de adrenalina para eles, que vinha sempre acompanhado de um cigarro e uma grande movimentação das mãos.
Escuro, garrafas quebradas, que que é? Com o tempo, a melodia da situação embriagou os dois, extasiados, andavam rindo, olhando para o alto e dançando com as sombras de si mesmo, perdiam-se propositalmente, quanto mais distante da realidade monótona, melhor.
Sentaram, olharam toda aquela imensidão sem sentido, caótica, e enxergaram beleza, devanearam, relatividade, por que não? Passado, presente e futuro, em círculos, túneis de sensações, era como se tivessem sentados em um banco dentro de um trem, trem para as estrelas, trem que corria, diferentemente das conversas, que pareciam sem presa alguma, espelhos em toda parte, em todos os vagões, e através deles, nossos personagens enxergavam seus respectivos passados, atormentados com tantas lembranças, correram, procuravam pelo futuro, mas não encontravam, correram mais, não queriam ficar acorrentados a nostalgia, até que um espelho refletiu as personalidades delirantes de cada um, trocaram algumas palavras, poucas, quase sussurravam para o outro lado do espelho, pararam então de procurar um futuro estático, saíram correndo daquele trem, pularam no chão, caíram, e riram demais, estavam sem dúvida, colocando em prática o conselho dado, que consistia em escrever o próprio futuro, e ela escrevia, nas páginas em branco do corpo dele.
Acordaram deste delírio e já estavam em outro, tropeçando entre tantas loucuras, se beijavam com sede, se abraçavam por inteiro, riam, giravam...giravam...a noção de espaço estava totalmente conturbada, entre tantos giros, os lábios acabavam se encontrando, saíram dos círculos e com certa dificuldade, tentaram andar em uma linha reta, ah..fracasso!
Precisavam de água, álcool, andaram, acharam e ficaram muito tempo naquele conto, falaram sobre eu não sei o que: identidade, carteiras, sono, que que é? Mais um copo, mais uma garrafa, é a última, eu juro, vem mais perto, esse é o sorriso, que sorriso? Silêncio..silêncio, que delícia de som, rosto, traços finos, aranhões que arderiam durante toda aquele eternidade que durava frações de segundos.
O dia já dava sinais de vida, aquela sensação estranha pairava, de fim..final..saíram como sempre tropeçando em suas próprias loucuras, se beijavam como se só existisse aquele instante, e realmente, era fato, esqueceram que eram observados, se abraçavam com intensidade, aquele dimensão estava prestes a acabar, pelo menos desta vez, andavam abraçados, não queriam ir embora, ouviram frases sobre o amor, faladas por uma cigana que não tinha nada de dissimulada, riram, talvez ficaram um pouco envergonhados, ou não, era intenso, chegava a faltar ar, o lábio, a textura, o ouvido, o pescoço, era harmonia dentro de uma desarmonia, se jogavam na perde, mordidas, queriam um gramado, acharam um gramado, fizeram um gramado, deitaram, era surreal, olharam os prédios de uma maneira tão diferente, a grama era macia, ela deitou no ombro dele, era onde ela queria estar, e sabe? Acho que ele também.
Os ponteiros insistiam em correr, e eles insistiam em ignorar, voltaram ao começo, deitaram, dialogaram entre os olhares, e foram em busca de novos cacos da garrafa quebrada, o parque..ah..o parque...as cores, as árvores, ela nunca tinha ido até lá, a luz era serena, a mescla do verde com amarelo, pessoas caminhando, fazendo seus alongamentos estranhos, eles riam, riam de si mesmo, do estado físico em que se encontravam, as pernas bambas, o corpo pedia descanso, sentaram em um banco, ele deitou no colo dela, era tudo tão surreal como aquela simetria daquele rosto, beijos concretos e subjetivos, faltava o ar, faltava a razão, e transbordava a insanidade de desejos aleatórios, ela não queria ir embora, queria ignorar todas aquelas pessoas, queria aquele êxtase momentâneo, senti-lo até as ultimas conseqüências.
Os gatos, a ração espalhada, a senhora que poderia ser uma bruxa, a percepção era toda muita intensa, eles abraçados, leves, driblando o cansaço físico por mais alguns instantes de proximidade, ele queria dormir ali, ela tentava ser racional, boba, boba, a realidade esperava por eles, saíram ao encontro dela.
O contanto físico com o passar do tempo, era cada vez mais forte, a coreografia das mãos, dos lábios e dos olhares eram poesias, deram boa dia aos espelhos, não seguiram ordem cronológica, se esconderam do sol, queriam fugir do dia que nascia, mas não conseguiram, não adiantava correr.
Transportes públicos, ela mudou de lugar, ele deitou no ombro dela, ela não largava as mãos dele, beijou seu rosto e seus olhares, era o caminho para a distância, saíram daquele trem sem espelhos, sem passado e sem futuro, andaram sem força, era informação demais, pessoas andando sem tanta presa, barulhos aleatórios, cores e sensações, as mãos não se soltavam, os olhares não se perdiam.
Sentaram em mais um banco, era o último, ela quem deitou no ombro dele, e dormiu, cochilou, por menos de vinte minutos, acordou com o coração disparado, olhou para o lado e percebeu que não se tratava de um sonho, sorte..eles conversaram não sei bem sobre o que, acho que nem os próprios sabem, creio que falaram mais em silêncio, trocaram segredos secretos entre olhares, se abraçavam, se beijavam, frases impulsivas, eu gosto de você, eu também, não quero ir embora, não quero que você vá, era poesia, poético, cinema, melodia, sono, alucinação e delírio.
Eu cuido de você, eu não preciso que cuidem de mim, todo mundo precisa um pouco, ela dizia..ela sabia, como ela sabia... desde um passado não tão distante em que ele apertou a mão dela com força, como se pedisse para ficar, ela nunca enxergou naqueles olhos uma frieza, uma pessoa fechada em seus próprios medos, ela via loucura com pitadas de ternura.
Não se meche nas carteiras alheias, pena que ela não entendia, excessivamente curiosa, não sei como, criaram forças até para brincar, ele segurava os pulsos dela, e ela se desconcertava com a textura da pele dele,temos que ir embora..
Levanta, se abraçam, o corpo gritava, os lábios beijavam, desceram as escadas, e ele abraçou como da primeira vez, primeira vez, aquela que nem outra dimensão era, abraço com o corpo inteiro, com a alma inteira e com a essência plena.
Plenos, aquilo era ser pleno, o abraço quase a sufocava,um fluxo de pensamentos gritava em silêncio, sussurrava em seus ouvidos todas aquelas lembranças tão recentes de um passado que não poderia ser estático, as cores, os beijos, as risadas sem presa, deitar em você, girar, girar, relatividade, dimensões, personalidades, álcool, desejo, textura, pescoço, me arranha, teus ouvidos me tirando a concentração, você me chamando de louca, sem razão, sem pudor, assim como teus beijos, vontade de ficar mais um dia, de sumir com você, te levar pra longe dos olhos alheios, sem ar, com a roupa rasgada, gira, sente e acaba.
Ele saiu, ela também, era engraçado porque agora o sem sentido era estar sozinha, sem ele por perto, sem a sua doce dose homeopática de insanidade lúcida, agora era sem lógica, andou com pressa e sem força, escutava as conversas, assistia todo aquele filme sem direção, via os atores e o cenário quebrado, acabou a sessão e a vontade de escrever.
Ana T.

Foto:Achada no google, aleatória!
[Os filmes alheios me inspiram!]
Câmbio/Desligo.

sábado, 10 de abril de 2010

Passado.

Eles estavam na calçada, era uma tarde quente de dezembro, o sol era intenso e a conversa sem presa.
-Mas você acha eu tenho um padrão?
-Acho que você é previsível demais sabe....?
-Não, não sei.
-Os assuntos tem sempre a mesma essência, as palavras não mudam, de uma certa forma é como se fosse a sua assinatura, então pode ser que isso seja bom....
-Pior é que eu sei de tudo isso e não acho nada bom, sempre leio inúmeros textos que me inspiram loucamente, textos diferentes, personagens mais loucos, palavras não tão glamorosa...mas daí eu começo a escrever e fica tudo igual, tudo...a minha essência, as mesmas idéias.
-Mas não pode ser teu estilo?
-Pode, mas enjoa, eu queria conseguir falar de crianças, de natureza e todas essas coisas que eu não acho tão interessante escrever.
-Você gosta de escrever sobre o amor?
-Só se for sobre um amor triste, mal resolvido, ou traições...dissimulações...nada muito puro não..
-Fatalista, pessimista, mas no final das contas aposto que é piegas.
-Piegas...eu adoro usar essa palavra.
-E se o texto fosse sobre o conceito do amor?
-Eu ia me sentir na época do cursinho sabe? Aqueles temas de redação todos filosóficos que se restringiam a norma culta e trinta e duas linhas, ah claro...usar a coletânea, por favor!
-Você é tão sarcástico...isso me irrita as vezes.
-Isso me irrita sempre, mas voltando a falar sobre o amor...deixa eu te contar uma viagem que eu tive ontem antes de dormir.
-Fala!
-Bom...eu comecei a pensar que a gente ama várias pessoas durante a vida...e com cada pessoa a gente concretiza o amor de uma forma diferente.
-Espera...você ta falando de amor entre pai..filho..assim ou amor carnal?
-Amor carnal..não que eu ache que a palavra “carnal” simplifique tudo mas enfim...a gente concretiza de várias maneiras...seja com as palavras, ações...poesias e até mesmo grandes filmes...a gente tira o amor do mundo das idéias e leva ele para nossa cama, para o nosso chuveiro...mesa..pro nosso cotidiano certo?
-Hm...e ai?
-E ai um belo dia acaba...certo...acaba antes..mas um belo dia a gente percebe...e resolve terminar todo aquele relacionamento, em alguns dos casos...
-É, em outros prefere a conformação cotidiana.
-Pois é...mas é todo aquele passado que aquelas duas pessoas formaram?É tão complicado lidar com isso, acabar um relacionamento...é necessariamente ter que acabar com um passado?
-Não..eu acho que não...é aprender lidar com ele.
-Eis a dificuldade...o passado está ainda presente em tudo, ainda mais se o casal tiver passado muitas coisas juntos sabe?
-Eu sei..mas não estou entendendo onde você quer chegar, para variar!
-Bom..nem eu sei ao certo, mas é algo assim...ai você consegue aprender a “lidar” com esse passado, aparece outra pessoa...você se encanta...e ai novamente...você está fazendo um passado...o passado é presente sempre! Como a gente consegue isso? Temos tantos passados, de tantas pessoas entrelaçadas na nossa vida...somos tantas vezes..resultado dessas pessoas..que sequer nem falamos..nem sabemos como estão...
-É claro, partindo do pressuposto que você sempre vai terminar com alguém...não existe possibilidade de manter o passado a flor da pele, e ainda por cima se vai ter outras pessoas na sua vida...existe o ciúme, que impede o contato extremo com seu ex namorado ou namorada! Somos sim, resultados de todas as pessoas que passaram pela nossa vida, mas não só no caso de namorados, namoradas, aventuras, amigos, enfim....é impossível a gente saber se todos estão bem...
-Pois é, esse é o meu ponto, não é incrível saber que você tem a essência de várias pessoas apesar de estar distante fisicamente e até emocionalmente delas?
-É..pensando por esse lado...é um pouco louco pensar nisso...você não se imagina não pensando no passado?
-Meu passado é a minha vida, tem como eu me imaginar sem ela?
-O presente e o futuro também são a sua vida.
-O presente pode ser, o futuro..ainda não sei..se eu morrer agora, o meu futuro não existe mais.
-As vezes eu acho que você sofre com esse teu encantamento pelo passado, creio que você não consegue lidar muito com ele, afinal..foi tão intenso..e a tua questão....seria o que fazer com todos esses passado que a gente não consegue lidar, nem esquecer...
-É...acho que eu sou viciado em passados.
-Tudo isso é loucura, você pode ser viciado em um futuro que já passou.
Bernardo olhou para aquela resposta e sorriu, abraçou o amigo e mudaram de assunto.

domingo, 4 de abril de 2010

Sete Belo com Sorvete

"A sua boca tem gosto daquela bala sete belo, sabe?
Fumar, beber, verbos tão literários, cheios de uma vida boêmia, repleta de noite, copos vazios, risadas, poesias, boinas e melodias. Sinto o perfume de toda essa intensidade e tento destilar entre tais linhas.
Palavras..palavras, me perco diante tantas sonoridades...gargalhada, café, brigadeiro, azul, amora, limão, hortelã, abacaxi, doses, homeopatia, insanidade, colegial..colegial..co-le-gi-al, parece sorvete derretendo na boca da menina, menina dos olhos cheios de pureza, mas o olhar dissimulado não consegue esconder o cigarro nas mãos finas, a coreografia que mão faz, dançando entre a fumaça que a boca proporcionou.
Talvez ela não pare de fumar, ela não precisa parar de fumar, afinal...os males nunca irão atingi-la, pois é minha personagem, minha colegial com gosto de sorvete de morango.
Ele também, o que possuiu beijo de sete belo, o garoto pode não fumar na vida real, mas sei que tem medo de agulhas, sonha com elas e acorda assustado, procura algumas marcas pelo corpo, talvez se resolvesse procurar em sua própria mente, certamente acharia, entre sorrisos e gritos, perfume e a pasta de dente..lá estariam..marcas que ardem..queimam...e vão arder para sempre...são os amores mal resolvidos, as cartas de amor extraviadas, a certeza infundada na eternidade que se desfez em frações de segundos, a morte do querubim, são essas cenas, que com o tempo foram estilhaçando, com todo direito ao som ensurdecedor dos vidros quebrando, infinitos pedaços estilhaçados, que cortaram sua mente aos poucos, fazendo com que sangrasse..e talvez um dia elas cicatrizem..até lá..seu medo de agulhas ainda vai te atordoar...dizem que não acaba nunca, que é um conto circular, um ciclo vicioso ou meu dado viciado.
Aqui, sendo meu personagem, ainda quero que você tenha esse medo, as fragilidades das pessoas as tornam mais amáveis.
Agora senta ao meu lado, acende seu cigarro, e segura a minha a mão com aquele olhar sereno, enquanto eu faço café.
Apaga a luz e não me deixe com marcas visíveis, posso fazer cócegas em você?
A tua risada ecoa nas linhas, sabe que quando ri, teus olhos ficam bem pequenos?
Tá certo, eu paro de falar, apaga esse cigarro, deita no chão que eu deito no seu ombro, não sabendo exatamente com o que eu quero sonhar, mas com a certeza de como eu vou acordar, e é sem dúvida com você olhando pra mim. Real, não no meu papel."

Ana T
Março de 2010.