segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

cacaso

cicatrizes não se transferem 

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

vinte e três

eu quero mais eu quero mais que o tempo eu quero mais que ausência que transborda da tua boca eu quero muito mais eu não quero restos nem reticências eu quero o que grita o que pulsa o que goza eu quero o tesão eu não quero essa medíocre vontade que nem ao menos saliva não quero teu toque falsamente cotidiano eu quero mais mais do que gemer por quinze segundos com tua mão abafando o som eu quero mais!
teu espaço já não me cabe não me vejo mais estilhaçada entre seus vinis eu quero mais do que essa parede ausente de mim eu quero mais! eu quero quebrar as paredes a vitrola quero o que escapa o que surta faz tremer o corpo! quero mastigar minha insegurança - engolir de uma vez o que não faz sentido - virar a dose dessa vontade de você, que só arranca meu sexo e minhas frações de tempo. chega! eu entendo. eu quero mais do que essa culpa careta. eu sei que já sustentei teu peso e desabei toda minha repulsa sobre você. e que é difícil rasgar a pele, mas sinto que você me segura, e eu te seguro, e quando recuou, a costura aperta. e você diz oi. dói. dói. dói. bom dia. vejo são paulo. estou seca. não quero esse grito que morre antes de transar. eu quero mais. eu quero outra pele. eu quero mais suor. maior gozo. eu fechei os olhos e estou descalça. vou sozinha. sem tons pastéis e sem a rainha elizabeth, que a propósito, se divertiu muito mais do que eu na tua cama.
e eu quero que se foda todos os meus achares e a atração cíclica e morna. já não tenho quinze anos, nem quero ter. eu quero mais do que esse sexo morno. chega de papai e mamãe. eu sei. eu sei. eu quero o excesso. a audácia do erro - da destruição. eu quero agora. chega. 
Acabou.


vale dizer que escrevi esse texto nas partes em branco do livro Tempestade e Ímpeto, do escritor Furio Lonza. o qual me inspirou muito, assim como o poema chamado O outrodo marginal Chacal.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

anotações de um café frio


um tá casando, indo morar na bahia, morar com a garota, abandou o gato, a casa de madeira, tudo, e foi pra lá estudar arte, morar com ela, dividir a vida, o outro esqueceu do que quer, vive triste, adoentado, vive enclausurado, isso é o que ele conta, eu não acredito não, acreditava até uns segundos atrás,  mas agora, quem sabe eu não acorde..eu disse não acorde? é bem isso mesmo. a outra vai casar na igreja, decidiu ser pastora. luiza virou evangélica, fiquei de luto por uns dias, mas depois decidir voltar a usar cores no corpo. não leio mais, nunca li, nem escrever, escrevo, sinto vontade, e logo em seguida passa, por preguiça ou qualquer coisa parecida. tomo meu café fro, e não fumo mais cigarros. até faço exercícios. mas continuo com o mesmo peso. ando fria, cética, e ao mesmo tempo choro por qualquer coisa, sinto algumas vontades caretas, é ausência de tesão. é ausência de tesão por alguém. não aguento mais esse papo, deve ser por isso que parei de escrever, as palavras são ensossas, mornas e escorrem. enfim, falar com você sempre afeta, afeta a pele. detesto finais, adoro as reticências, vá embora e não me mande um postal, talvez te encontre perdido em alguma rodoviária desse brasil..brasil com minúsculo sim...ou talvez não. talvez eu fique aqui nessa cidade que sufoca, mas já não sei viver fora desta massa amorfa acinzentada. olha, estou falando demais para variar..e você sempre em silêncio, eu sempre pensava: por que ele nao fala? por que? talvez eu não te deixasse falar. mas por que voce nao gritou? olhe, deixa que eu pago o café. boa viagem. siga sem dores. procure um médico para cuidar desse estômago. plantas medicinais não servem. bons caminhos...que teu corpo queime em brasa. sempre esse impasse. nunca me entrego. é tua voz que ecoa e não cala. é tua sangue barato teu vinho barato. quebrei a garrafa, cortei o corpo. é sempre assim. não te deixo ir. não vou. respiro mais uma vez, e digo. - vou continuar. só não sei pra onde.
um grande beijo. da tua Ana. T.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

que saco cheio
ele dizia
não havia a menor vontade
nem dele nem para com eles
os laços haviam se desfeito, enfim
chega
já não gostava mais dos risos
nem dos toques
a pele não transbordava mais nada
tempo de reclusão
ele pensou

estou tão cansado
pra vocês
mas ando cheio de vontade
pra mim

então
foi embora
e não escreveu nem ao menos
um bilhetinho
chega dessa história
sem endereço e sem cartão postal
quero mais é me esquecer
passar por essas ruas
e não sentir nada além
de repulsa
- cansei mesmo
todos enxergam
todos calados
esperando que ele vá embora logo

lembrou de mário de sá carneiro
"Não sinto o espaço que encerro
Nem as linhas que protejo:
Se me olho a um espelho, erro -
Não me acho no que projeto."

gritou alto
e foi embora
sem insetos gordos
sem meios sorrisos
sem nada pela metade
ausente
enfim

-chega.


babaca

assim
só pra tirar da boca
ela disse
- babaca
- você não está entendendo quase nada do que eu digo
- e nunca entendeu
- babaca
ela disse mais uma vez
e lembrou do livro "Vida Secas" de Graciliano Ramos, sabe-se lá pra quê por quê
- é chucro, não sente
só grita
nem isso

- babaca

e foi embora
cuspindo no chão
e sem olhar pra trás
pelo menos, dessa vez


sábado, 20 de outubro de 2012


é você quem vem
com teus corpo
sem gosto
e eu sempre caio
na tua

e depois
grito sozinha
sozinha
porque você percebe que ainda exerce
qualquer tipo
de afeto
e vai embora
já se sente seguro novamente

e pode continuar
por ai

sábado, 6 de outubro de 2012

café requentado


eu não aguento mais
eu já não suporto as culpas
os pensamentos tortuosos
os sonhos conturbados
não aguento mais a espera
nem a falta de ar
me pego sempre pensando naquele filme
que você não assistiu
eternal sunshine of the spotless mind
vejo aquelas cenas
e tenho vontade de fazer exatamente aquilo
apagar cada segundo
apagar parte me mim
matar
estilhaçar
pra não sentir mais nada
nem um fração sua no meu corpo
já não me lembro sua voz
nem o cheiro do teus cabelos
éramos tão lindos
sei que aqui destilo idealização
mas éramos lindos
com nossos cabelos ao sol
a luz
não sei mais como está seu quarto
a pequena pia
a escova de dente que você insistia em guardar em uma caixa de pasta
velha
já não sei como estão suas canecas
se você as quebra ou não
já deixamos claro um pro outro
que nos odiamos
profundamente
eu sei que você nega
eu também
mas sabemos que é isso
e isso me mata
hoje
acho que choro por isso
choro porque de algum modo não consigo te tirar de mim,
não consigo matar teu ódio
nem estilhaçar o meu
mas hoje morro principalmente
porque sei que o nosso ódio é mútuo

terça-feira, 2 de outubro de 2012

vinte e dois


era hoje
o dia
nada mudara desde seus vinte e oito anos
e finalmente era o dia
todos estavam feliz
a mesa repleta
ela ainda pensava nele
- aquele idiota
tantos anos sem trocar uma palavra
ele se quis presente
mesmo tão ausente
ele quis atormentá-la
afinal, ela merecia
palavras
afeto fingido
falso
da boca pra fora
ela não resistiu
apesar da leveza que escorria em tua pele (por pouco tempo)
mandou uma carta
com seus pulsos cortados
e algumas tripas
ele
percebendo que ela ainda o amava
que ela ainda pensava nele todos os dias de sua vidinha medíocre
respondeu sem medo
parabéns
parabéns
apenas isso
e mais nada
tudo o que você espera
de um grande amor


nem chorar
ela conseguiu
engoliu por fim
a última dose do amor medíocre
que lhe cortava

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

soneto para um amor medíocre

você tirou meu tesão
secou minha saliva
contraiu minhas veias
você foi embora
sufocou meu gemido
fez do meu gozo, vomito com gosto de café
cortou minhas unhas, desfez meus arranhões
você arrancou meu gosto
por mim e pelos (corpos) alheios
você fez da minha febre (alta)
mal-estar (de quinta)
calou meu grito, meu ecstasy, meu êxtase 
percorreu minhas brechas tortuosas (cheias de tontura) e instaurou a REPULSA
que eclodiu em meu corpo brotando na pele em forma de NOJO
o meu resquício é um gosto azedo/amargo que escorre pelas extremidades
e não cessa
você foi embora / você não volta
eu não te escuto, eu não te vejo, eu não te engulo
você
foi
embora
você 
não
volta

terça-feira, 28 de agosto de 2012

lô borges

"Achei nosso nome na tempestade 
Numa asa cortada 
Ou na página do livro amor 
Na página que faltou 
Na poeira de uma bomba 
Será agora e saber.."

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Pra que rimar amor e dor?


Para ler ao som de: Moro Na Filosofia – Caetano Veloso

Acordei às oito horas, mas em seguida voltei a dormir, óbvio, eu não queria acordar. Estava tentando esquecer o ato impulsivo que cometi na noite anterior, mas era fracasso, afinal, bastava eu fechar os meus olhos, para que o sonho repetisse a maioria dos elementos que meu ato envolveu. Sua casa suja, os móveis dispostos caoticamente, o vitrola ligada, o gosto de café com leite, teus lábios molhados, e eu, ali, no meio do teu quarto, rompendo com a harmonia insana daquele espaço. Eu, estática, e tão deslocada, e você sentado, esboçando um riso com o canto dos lábios, e tragando seu cigarro de palha, você esperava que eu falasse algo, afinal, eu entrei em tua sua casa. Veja bem a frase, eu entrei em sua casa. A minha mente parece que só consegue girar essas palavras. Eu entrei em sua casa, eram dez horas da manhã quando subi as escadas e bati na porta, eu sentia todas as minhas veias pulsarem.  E ninguém atendeu, respirei aliviada, mas pensei no que iria pensar no caminho (longo) de volta e me senti novamente ansiosa. De repente a porta se abriu, era você, era eu, era aquela casa, aquela luz de sempre, o sempre que não acontecia há dois anos e três meses, dois anos e três meses, escute bem. Você ficou me encarando como se esfregasse continuamente as lentes dos óculos, mas você não usava óculos, eu estava em um silêncio pleno, não conseguia falar incessantemente como era de costume, afinal, esse costume se perdeu com os anos, se diluiu com cada segundo de ausência que tivemos de encarar. E era você ali me olhando e eu do outro lado, você abriu mais a porta, não me convidou para entrar, mas eu entrei, fui direto no teu quarto, passei logo pela sala, não queria me perder ainda mais, e eu não consegui sentar na sua cama, o silêncio era ensurdecedor, não conseguíamos falar, você, como sempre, parecia tão bem, tão calmo, e eu, inquieta, com meus pequenos movimentos cortantes, roias as unhas, mordiscava a cutícula, até que o sangue invadiu os lados dos meu dedos, era grotesco, você então, rasgou o silêncio – você ainda faz isso? arregalei os olhos, ainda queria manter o silêncio, mas é claro que se havia feito aquilo era para te provocar, te instigar. Pensava em fluxos, ao mesmo tempo que queria arrancar sua roupa e engolir você, eu estava em surto, meu ar, como sempre, era escasso. Perceba que uso muito as palavras sempre, costumes, e o quão incoerente elas são, eu diria até, anacrônicas, talvez? Não existia mais contexto para eu dizer costume, costume envolve o cotidiano, e isso era o que nós justamente não tínhamos. Você apagou seu cigarro, acendeu uma erva, tocava Caetano, pensei em te tirar para dançar, mas não conseguia, me sentia presa em uma alucinação de ácido lisérgico, eu andava em círculos, e você parecia degustar aquela cena, não com raiva, nem com rancor, mas com calma, que sempre me irritou em você. Mas não conseguia pensar sobre o que você pensava, eu sempre fazia isso, mas ali, eu não conseguia, eu não pensava, eu engolia saliva e tentava voltar a mim, era o ácido, era o começo da viagem, mas céus, eu estava ali, eu sabia porque eu estava ali. Não fazia a menor idéia de quanto tempo estávamos ali, você girando na cadeira, e eu girando no chão, nos passos, tropeçando em passos falsos. Pra quê rimar amor e dor? De repente um ciranda de lembranças coloridas me envolveu, mas logo escapei, queria o agora, queria, naquele instante, o que sempre me servia de dimensão para eu pular, para eu voar, para eu fugir, o agora. Sempre usei o agora pra fugir, seja para viajar pelos fluxos de nostalgia, para inventar, ou quem sabe para eu me perder no futuro, mas ali, naquele instante, eu queria aquele pedaço de realidade, de ação que existia em mim. Então eu respirei fundo, encarei teus olhos, encostei minhas mãos nas tuas, puxei você daquela cadeira, você se levantou, não tirava meus olhos de você inteiro, você não parecia entender-muito-bem-o-que-estava-acontecendo, mas também estava imerso naquele espaço, segurei bem forte, sentia minhas veias quase estourarem, me acalmei, precisava me acalmar, eu queria uma voz calma, e eu respirei toda luz, deixei a melodia brincar de ciranda em meu corpo, pela minha circulação e eu te disse: casa comigo?

sábado, 18 de agosto de 2012

Ela.


Para ouvir ao som de: Os Povos - Clube da Esquina

Oi. Hoje acordei e estava um dia ensolarado. Sabe, acho que a verdade é que eu detesto esses dias lindos. Detesto sim, porque sei que você os adora. Porque sei que eram esses sábados ensolarados que eu vestia um pano qualquer e ia correndo pro teu jardim. E hoje eu acordei e voltei a dormir, e acordei novamente e voltei a dormir mais uma vez, e isso aconteceu de novo, mas tive de acordar alguma hora, tive de levantar da cama e olhar para o sol, olhar para essa luz insuportável que me faz lembrar todos os gostos dos nossos sábados. Eu estou bem, minha saúde está cada vez melhor, ando rindo bastante e me exercitando, mas esses dias ensolarados, esses sábados ensolarados rasgam o meu pulmão aos poucos e assim vou ficando cada vez mais sem ar. E eu me deito na cama e choro, choro tímida, choro para passar, choro porque não sei o que fazer com esse sol, porque não sei o que fazer com esses dias, com esse vinil que não para de tocar. Essa nova relação me assusta, sei que preciso me acostumar, mas ainda é tão difícil, ela é tão fria e tão distante, ela não me cobra satisfações e eu fico feliz com isso, mas ela não me escuta em nenhum momento, às vezes sinto sua respiração gelada antes de dormir, talvez seja o único momento em que sinto a presença dela mais concreta, de resto, ela ocupa o meu corpo, minhas veias, meu choro, mas não sabe andar de mãos dadas, nem sonhar, porém com ela, consigo escrever boas prosas e sambas tristes. Preciso me acostumar, ela é fria, mas nunca me deixa. Um dia desses, eu a encaro. Imagino-a alta e gélida. É a Solidão, com gosto de vidro e corte. A imagem dela se confunde com a da Morte. A música cessa e eu me levanto com ela. Logo, você se acostuma. Ela me diz em um sussurro gélido. Acredito. Logo, eu me acostumo.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

antes das dez


o que é a tua vida, afinal? ontem sentei em um boteco e encontrei tantos....um moço passeava com uma pequena cadela, Laika, era seu nome. sempre doce. sempre amedrontada. só hoje eu percebi que o dono também vivia assim. já havia ouvido histórias de que andou bebendo demais, e tropeçou no caminho pra casa. ontem, hoje, seja lá qual dimensão, ele apareceu, foi simpático como todos os dias, mas todos notaram que seu rosto estava diferente, triste, destilando qualquer angustia e choro, todos falaram, ele sorriu, fez que concordava, deixou o cachorro comigo, enquanto foi apanhar um copo de suco de uva com vodka. todos reparam nele por alguns segundos, logos depois, já haviam retomado seus assuntos e diálogos, o homem, que teve um curto espaço de atenção, tentava terminar seu raciocínio, mas ninguém o ouvia, eu ouvia, e me senti mal por ele, e sentia raiva dos outros, e sentia raiva de mim. a tristeza era sua estampa. Eu pensava que talvez, eu gostasse apenas de ouvir e falar, e não pensar nas relações que estavam expressas ali, mas logo depois me achei arrogante e bebi outro copo de cerveja. após um tempo, fui dar uma volta, eu e alguns amigos leves, voltamos, o homem com a cadela estava com um diálogo em aberto, mas foi as pessoas voltarem para as suas antigas posições, para ele, novamente, falar sozinho. a cadela  tremia, minhas mãos estavam sobre ela, e eu sentia e também tremia. depois ele foi embora, cambaleando, senti ódio, tristeza, vontade de chorar, não sei bem, gosto dos olhos dele, depois, começamos a falar de amor, ah o amor, “a mais bela e derradeira repressão de si mesmo” como já diria Stirner. o moço, Bebeto, tão sorridente, alto, bonito, contando a história das duas mulheres, imaginei Bebeto namorando Rafa, imaginei um casal divertido, peculiar e cheio de vida, imaginei Bebeto conhecendo Juliana, menina bonita, imaginei Bebeto traindo Rafa, imaginei os pensamentos de Bebeto, as incertezas, a hora em que ele entrava no chuveiro e pensava em tudo isso, Bebeto terminou com Rafa e começou namorar Ju, depois de quatro meses percebeu que amava Rafa, terminou com Juju, e tentou por um ano e meio voltar com a Rafa, até descobriu novos nomes de flores, e fracassou. Juju gostava ainda de Bebeto, o moço pensou em desistir e saiu, foi pra Los Angeles com a Juju, era seu sonho, praia, vida nova, mulher nova, ficaram felizes, marcaram outras viagens, era tudo tão livre e leve, antes da viagem, havia ficado com Rafa, esta,quando soube que Bebeto estava do outro lado do mundo, surtou, sentiu a ausência rasgando sua garganta, mandou sinais de fumaça e Bebeto voltou. 40 dias depois ela disse que não gostava mais dele. agora Bebeto me contava isso rindo, mas fiquei pensando em quantas vezes ele pensou em suicídio. provavelmente nenhuma. Outra história escapou dos lábios alheios,a morena terminou depois de cinco anos, o mais velho não acreditava que fosse possível amar mais de uma pessoa, a morena comprou os móveis para o novo apartamento, afinal, eles voltaram depois de quatro meses, iam casar, ele, não voltava. sumia, ela voltou a odiá-lo, terminaram. – vocês se falam ainda? não. nunca mais. sabe, diante de tudo isso, eu enlouqueço deliciosamente, o amor...tanto..transbordamos tanto...hoje ouvi histórias tão tristes que sinceramente, me esqueci da minha, ainda mais pela maneira como foram contadas, com risadas e cerveja. talvez,de fato, eu seja muito sentimental.

beijos
Ana T.

sábado, 4 de agosto de 2012

frivolidades ensolaradas

Ler ao som de: Giz - Legião Urbana


às vezes eu ainda choro
bem pouco
às vezes eu ainda sinto muita saudade
não é nada compulsivo
é só meio triste
nesses malditos dias ensolarados
as coisas ficam um pouco pior
sei que você gosta de sol
além disso, cria-se uma expectativa tão chata
perante essas manhãs
todos tem de sair e aproveitar
e nos dias de chuva
nos mandam ficar em casa
assistir filmes
na chuva, eu quero sair (mentira)
no sol, talvez me esconder
eu sei, eu sei, estou sendo rabugenta
estou desanimada
com saudade
um pouco machucada
nada demais
estou cheia de preguiça
e sem vontade de fazer absolutamente nada
estou sozinha
sozinha
ha tanto tempo não sei o que é isso
a necessidade de ter alguém por perto sempre transbordou
contatos, ligações, beijos e mãos dadas (por mais que, em alguns instantes, eu detestasse algumas dessas demonstrações de amor)
às vezes eu gostava
muito
reparava no que ficava suspenso
ternura
reparava no que escapava
sentia

a solidão é fria
me sinto imersa em um caldo quente de emaranhados 
observo em silêncio
minha falta de ânimo
sei que logo passa
já estou tão melhor

mas ainda incomoda
esses pequenos choros
repentinos
me tiram do sério

mas tudo bem
tudo bem

"E mesmo sem te ver
Acho até que estou indo bem
Só apareço, por assim dizer
Quando convém aparecer
Ou quando quero
Quando quero
Desenho toda a calçada
Acaba o giz, tem tijolo de construção
Eu rabisco o sol que a chuva apagou
Quero que saibas que me lembro
Queria até que pudesses me ver
És parte ainda do que me faz forte
E, pra ser honesto,
Só um pouquinho infeliz..."

sei que você não gosta de renato russo
mas cabe muito.

um grande beijo
um pouco amargo
um pouco triste
mas nada que mate

terça-feira, 3 de julho de 2012

tarde

essa luz
essa tarde
ela estava bem
acordou com sono
mas é típico dela
demorou para arrumar os cabelos
mas de repente
olhou as janelas abertas
e acabou por chorar
pois é
talvez seja ainda mais difícil

esse sol
já passa das cinco
e aquele dia ainda estoura em minha mente
escuto
tropeço
respiro

imagino você com seu cigarro de palha
e suas poucas palavras
risadas
e qualquer coisa que não seja minha

qualquer dia
estilhaço
de uma vez

ainda me restrinjo as pequenas doses
de suicídios
cotidianos

não durmo

segunda-feira, 2 de julho de 2012

à palo seco

hoje o dia tem sol
acordei com dificuldade
abri as janelas e os armários
e joguei tudo fora

confesso
guardei algumas coisas (poucas)

mas já respiro melhor


quinta-feira, 28 de junho de 2012

dia vente e seis

sempre que terminamos
eu te ligo e você me diz
que está jogando 
coisas foras
imagino você jogando pedaços de mim
ei, nessa manhã
me jogue inteira

sexta-feira, 22 de junho de 2012

lua sem café com leite


Ler ao som de: Qualquer música que te lembre um grande amor.

Ana estava em seu quarto, deitada sobre a cama, janela aberta, pensamentos em fluxos, quando ouviu – olha a lua. era a voz dele.  A menina levantou em um impulso. Sentiu calafrios. Sabia que estava sozinha e que Theo bem distante. Debruçou na janela, quase torceu o pescoço, mas não conseguiu enxergar a lua. Voltou a deitar, a voz voltou, Ana se irritou, já não falava com Theo há alguns meses, a voz insistia. – Olha a lua, Ana. Ana não acreditava em Deus, nem tinha medo de fantasmas, mas transbordava pavor da loucura, da paranoia. Ana pensou em Theo, nos olhos amendoados, nas vírgulas, no ácido, Ana ainda amava Theo, , mas estava finalmente conformada daquele fim. Provou a si mesma que o único jeito de seguir era sem qualquer resquício dele. Foram muitos gritos, pratos quebrados, noites e dias sem qualquer nexo, remédios (de todos os tipos), ligações exaltadas, insônia, até o ápice, que foi, sem dúvida, a rejeição. Uma noite de porre, muito choro, desconfiança, cachaça, e de repente ela se aproximou de Theo e ele disse – não, Ana. hoje não. Ela sabia por que não, ela imaginava...até hoje não tem certeza, nem vai ter. Ana chorou, saiu daquele espaço físico, chamou um táxi, e não foi embora, conversaram embaixo de chuva e embaixo de gritos. Foi uma das piores noites de sua vida. Nem seu olhar clínico pra cenas de cinema foi salvo. Só chorava, andava para os lados, fumava um cigarro que apagava toda hora, afinal, chovia muito. Os dois encharcados – a que ponto chegamos. Pensavam os dois. Aquele desconforto, aquele gosto amargo. Ele conseguiu fazer com que Ana desistisse do taxi, entraram, gritaram na cozinha, mas não gritaram entre eles, gritaram para eles mesmos, gritaram de desespero um para o outro, sempre foram, antes de qualquer coisa, bons parceiros. E naquele instante, Ana precisava de Theo e Theo precisava de Ana, mas era impossível, cada palavra sangrava. Dormiram juntos. Abraçados. Ana tentou acreditar que no dia seguinte, iriam almoçar em um restaurante japonês e em seguida passear no parque. Amanheceu, logo se arrumaram e saíram pelas ruas da pequena cidade, não se falavam muito, apenas algumas farpas, não restava muita força. Pegaram o mesmo ônibus, ela decidiu fazer um caminho mais longo para ficar mais tempo com Theo, mas o assunto só doía, a presença só estilhaçava aqueles bichos. Desceram, eram um dia ensolarado, estavam em uma esquina, ele, de violão nas costas, ela, cachecol e boina vermelha, ambos cansados, machucados – vai até o outro ponto comigo? ela sabia que se fosse, voltaria chorando, aquele caminho, aquele parque, aquelas malditas lembranças... – não. não vou. Nem me lembro se existiu algum abraço, na minha memória, vejo uma tentativa de interação frustrada. Ana respirou fundo e sentiu que daquele dia em diante, não haveriam mais tentativas. Ela havia finalmente se esgotado. Não era questão de orgulho, muito menos de valorização própria. Era a dor, que invadia demais o corpo dos bichos. Ambos haviam chegado a extremos, aos cacos mais cortantes, ambos haviam bebido demais, chorado demais, tentando demais. Agora, observando os passos da menina indo embora, lembro-me daquela frase do Caio Fernando Abreu “Não temos culpa, tentei, tentamos.”. Ela não pensou em nada, nem no autor, nem em mim, apenas seguiu seu caminho sem chorar. Passeou com cachorros, não retornou a ligação e fez da raiva uma grande amiga. Seguiu. Depois daquele dia, não encontrou mais com Theo, nada, ligações, nem por outros aparatos tecnológicos. Ele foi viajar, ela ficou sabendo, não comentava mais de Theo, não escrevia mais sobre Theos (há muitos anos deixou de escrever sobre Theo). Não chorava mais. Às vezes, talvez, um pouco depois, algumas lágrimas e só isso. Mas sonhava, sonhava toda noite. Ana não tinha mais vontade de correr para casa dele, mas queria saber se estava bem, se estava comendo frutas, ou se estava muito magro. Entretanto, ela bem sabia, que se houvesse qualquer interação, o suposto equilíbrio seria estilhaçado mais uma vez. Parecia que tudo estava pairando...em suspensão..um fio invisível...Mas de uns dias para cá, ela se assustou, encontrou tantos amigos com novos namorados, parceiros, seja o que for, amigos desses que bebiam cerveja no bar sempre que conseguiam, apesar das cidades diferentes, das faculdades caóticas, do tempo ausente, amigos esses que namoravam entre eles, amigos esses que não se veem há tempos. Ana começou a sentir medo, mas não tinha coragem de sustentar nenhuma afirmação. Ana sentia saudade de seu parceiro. Lembrava sim, de todas as noites de brigas, mentiras, pequenas omissões, paranoias, repulsas e de como aquela relação estava se tornando cada vez mais doentia e repulsiva. Mas ainda assim, sentia falta de como Theo a fazia rir, gargalhar. Não tentava mais sobrepor os dias deliciosos aos repulsivos, não tentava mais nada. Vivia com medo, de que de um dia pra noite, voltasse a chorar compulsivamente, voltasse a querer, vivia com medo  de que aqueles dias fossem uma mentira bem construída, isto é: de que todo aquele papinho de conformação, de realmente-não-vamos-morar-juntos-nem-teremos-um-gato-gordo, fosse uma bela enganação. Mas por hora, não era isso, por hora, ela sabia, ela sabia que iria seguir. Que em breve teria de se acostumar com ele e mais alguém, mas ainda não pensava tanto nisso, não bebia a dose de suicídio cotidiano, ainda. Mas às vezes a imagem vinha, aquele café, pão com manteiga, bicicleta, alguém morando com Theo, dividindo a cama, ouvindo os anseios, mas logo (?) passava, - a vida é grande, a vida é grande. dizia sempre. A vida é tanto. Só sei que de um tempo pra cá, Ana enxergava Theo, mesmo que fosse no mundo das ideias, gostava de saber que ele estava ali, por perto, gostava de imaginar que naquele instante ela sabia mais ou menos o que ele estava fazendo. Às vezes ensaiava um diálogo, mas logo lembrava do ciclo de desastres que poderia desencadear. Ana e Theo, bichos machucados. E foi ontem que deitada, ouviu a voz do garoto – olha a lua. olha a lua Ana. Do outro lado da cidade, ele não ouvia nada e muito menos, dizia. É verdade, sim, como Theo mesmo comentava, escreveram juntos um instante de suas partituras, costuram com pele, sangue e risos, misturaram, brincaram no parque, caíram no chão, lúdicos ou não. Mas Ana e Theo não tinham nada de especial, o amor deles não era maior do que o dos outros, nem a dor.
Theo fumava uma erva e preparava um café, enquanto a Ana tratava de se levantar e foi providenciar um copo de leite quente. Café com leite, sem lua e sem muito drama.

Fim.

Com muito amor, Ana T.

Três de Agosto de Dois Mil e Doze às três horas vinte e dois da manhã.

Câmbio/Desligo

quarta-feira, 16 de maio de 2012

reticências contaminadas

Para ouvir ao som de: Ave, Lúcifer - Os Mutantes

contágio
nos contagiar 
com o sangue que habita
a lâmina afiada (sem qualquer afinação)
contaminar a nós, que já somos tão contaminados
espalhar a nossa angustia, o nosso amargo - o que em nós queima - o que nos tortura
sentir o sangue denso - correndo pelas veias entupidas. tentando correr - mas não consegue. denso e lento. 
arde
 
e nós, transbordando o peso
tentamos 
usar das palavras, dos gestos
para destruir 
o silêncio que sufoca

e desde quando formar sílabas
em formas de som
alteram a ausência do meu tesão?
 
penso
canso
enjoo do movimento
deito na cama e tento dormir
o gosto amargo continua 
em meus travesseiros
colchas
vivo entre lugares, uma espécie de 
limbo quente, emaranhado de tédio
e passividade

nem puta
nem santa
nem viciada
nem sóbria

percorro
recorro aos deuses 
com os olhos entreabertos

o gosto amargo é contínuo
o cheiro doce me enjoa 

o desespero não cessa
a ternura não finda

tropeço
mordisco a última pele
e adormeço.

domingo, 13 de maio de 2012

música para um domingo frio

Se Puder Sem Medo - Oswaldo Montenegro 

Deixa em cima desta mesa a foto que eu gostava
Pr'eu pensar que o teu sorriso envelheceu comigo
Deixa eu ter a tua mão mais uma vez na minha
Pra que eu fotografe assim meu verdadeiro abrigo
Deixa a luz do quarto acesa a porta entreaberta
O lençol amarrotado mesmo que vazio
Deixa a toalha na mesa e a comida pronta
Só na minha voz não mexa eu mesmo silencio
Deixa o coração falar o que eu calei um dia
Deixa a casa sem barulho achando que ainda é cedo
Deixa o nosso amor morrer sem graça e sem poesia
Deixa tudo como está e se puder, sem medo
Deixa tudo que lembrar eu finjo que esqueço
Deixa e quando não voltar eu finjo que não importa
Deixa eu ver se me recordo uma frase de efeito
Pra dizer te vendo ir fechando atrás da porta
Deixa o que não for urgente que eu ainda preciso
Deixa o meu olhar doente pousado na mesa
Deixa ali teu endereço qualquer coisa aviso
Deixa o que fingiu levar mas deixou de surpresa
Deixa eu chorar como nunca fui capaz contigo
Deixa eu enfrentar a insônia como gente grande
Deixa ao menos uma vez eu fingir que consigo
Se o adeus demora a dor no coração se expande
Deixa o disco na vitrola pr'eu pensar que é festa
Deixa a gaveta trancada pr'eu não ver tua ausência
Deixa a minha insanidade é tudo que me resta
Deixa eu por à prova toda minha resistência
Deixa eu confessar meu medo do claro e do escuro
Deixa eu contar que era farsa minha voz tranqüila
Deixa pendurada a calça de brim desbotado
Que como esse nosso amor ao menor vento oscila
Deixa eu sonhar que você não tem nenhuma pressa
Deixa um último recado na casa vizinha
Deixa de sofisma e vamos ao que interessa
Deixa a dor que eu lhe causei agora é toda minha
Deixa tudo que eu não disse mas você sabia
Deixa o que você calou e eu tanto precisava
Deixa o que era inexistente e eu pensei que havia
Deixa tudo o que eu pedia mas pensei que dava

quinta-feira, 10 de maio de 2012

poeira e Caetano

Para ler ao som de: You don't know me - Caetano Veloso

Magro e menino, talvez a compulsão pelo cigarro atrapalhasse a feição de garoto, mas não, mesmo fumando sem parar, seu rosto ainda era novo. Pele branca, cabelos loiros em cachos. Gesticulava muito, nos intervalos, destilava indiferenças. Olhos pequenos, um pouco assustados, não, não era isso, os olhares eram atentos, queriam captar toda aquela multidão e seus pequenos gestos. A iluminação exacerbada atrapalhava o azul dos olhos. Apesar das características angelicais, não parecia um anjo, era só um menino com um maço de cigarros no bolso da calça. Maço este que tinha apenas mais três cigarros, quando Pedro percebeu, o desespero o invadiu. – Aposto que não existem lojas de conveniências por aqui, muito menos botequins. Até poderia pedir cigarros para desconhecidos, mas gostava de ter seu maço em mãos, a questão ia além do gostar, era necessidade, precisava daquele contato da pele com o plástico do maço de cigarros brancos.             
Resolveu sair da multidão, com alguma dificuldade, conseguiu, logo sentou em uma calçada, estava ligeiramente ébrio, acendeu um cigarro – ainda faltam dois. Pensou. Ao seu lado um casal de mulheres trocavam carícias explícitas, qualquer moralista se indignaria, qualquer malandro de chapéu demonstraria tesão, Pedro não fez nada, talvez nem tenha reparado. Fazia tempo que Pedro não sentia. Havia mais um de três meses que não escrevia, nem pintava. Ainda conseguia ler, mas com uma freqüência bem menor do que a normal. Pedro agora gastava suas horas com pequenas coisas, pequenas e incessantes atitudes chatas, as quais eu poderia passar horas discorrendo aqui, mas são tão corriqueiras, que prefiro que o leitor as imagine.  (por pouco tempo, de preferência, afinal, são entediantes...)
 O problema não era concluir tais ações, mas sim o tempo que gastava com elas: demorava horas para ferver a água para seu chá, procrastinava o máximo que podia para escovar seus dentes. Entre essas ações, roia unhas compulsivamente, quando tentava ler mais de uma página, os dedos não agüentavam de tanto que eram mordidos e sangravam, fazendo com que Pedro levantasse de sua cama para buscar materiais para um curativo, que em poucos minutos iria arrancá-lo para voltar a atitude de auto-flagelação. De alguma forma, roer os dedos lhe trazia algum tipo de concentração.
Pedro ainda estava sentado, fumava seu último cigarro, enquanto observava o desenho das nuvens. Estava distante da cidade grande, achava que com esse afastamento, conseguiria achar alguma dose de tesão. Estava em um festival, havia se perdido de todos seus amigos, não achava justo que seu tédio os contaminasse. Depois era só tentar alguma comunicação, ou ir direto para o local onde estavam hospedados, lembrava bem o caminho, apesar daquela multidão efervescente.
Seu cigarro acabou, apesar da ausência de tesão que existia dentro de si, se interava bem com as pessoas, era simpático, sorria com freqüência. Seus amigos estavam acostumado com seus sumiços, os mais próximos sentiam algo diferente naqueles olhos. Não havia explicação plausível, estava tudo bem, sem mortes, sem grandes rompimentos amorosos, a saúde, apesar da asma contínua, estava em perfeito estado.
A moça sentou ao seu lado, reparou nas feições de menino, também estava entediada, roia as unhas compulsivamente, Pedro não a olhava, Pedro não estava ali, ou estava tão inserido naquele espaço, que não enxergava mais nada. Ana não conseguiu evitar o olhar fixo, Pedro era bonito, apesar de tão garoto. Ela notou o isqueiro na mão, o maço vazio na outra, o olhar azul perdido. Não teve dúvidas. – Quer um cigarro? Ele não respondeu, não ouviu. Ela insistiu. – Garoto, você quer um cigarro? Pedro arregalou os olhos, parecia ter saído de um sono profundo, assustado em notar que alguém estava tão próxima de seu corpo. – Desculpe, estava distraído, quero dizer, sou distraído. – Tudo bem, isso eu já notei. Mas você ainda não me respondeu, quer um cigarro? – Por favor! Ana apanhou o maço, retirou um cigarro da bolsa, acendeu e começou a fumar, com a outra mão, tirou outro maço fechado da bolsa (que era enorme, diga-se de passagem) e entregou a Pedro. – Acho que você precisa mais dele do que eu. Ele sorriu tímido e um pouco assustado, tentou parecer seguro. – A senhorita está flertando comigo? Ana riu, chegou ainda mais perto de Pedro e bagunçou seus cabelos. Tirou da bolsa uma garrafa de vodka e ofereceu ao menino dos cabelos em cachos. Beberam muitos goles dela.
 Deitados em uma cama de solteiro, a janela aberta e muito frio, Ana vestia apenas um casaco, não estavam abraçados, Pedro fumava um cigarro, a fumaça invadia o quarto, a moça logo acendeu o seu. Era uma cena bonita. Ambos olhavam para o céu. Não havia nada de romântico, não para eles. O sexo havia sido bom, o ritmo de um mesclado ao corpo do outro, sede da pele alheia. Não era mais noite, nem madrugada, o dia se aproximava aos poucos. Nenhum dos dois pregaram os olhos, nenhum segundo. Trocaram algumas palavras em meio ao gozo,  entre uma audácia e outro gole de vodka. Ela dizia – Às vezes acho que a ausência de tesão paira suspensa no ar, e tira o ar de todos aos poucos. Pedro achava interessante a frase, mas não dizia nada, fumava o penúltimo cigarro do maço que a moça havia lhe dado. Ana continuava – Sou muito pessimista, não escrevo há tempos, estou enjoada do emaranhado quente que existe em minha mente. O garoto não a achava tão cética, enxergava prosa naquele corpo. Sentiu vontade de desenhar, não por ela, por nada. Apenas sentiu a vontade em sua boca.  – Quando voltar para capital, quero ler Leminski. – Talvez filmar um cair de folhas... – Você rói unhas? – Compulsivamente. – Seus acentos me excitam. – Certamente você pontua as frases de uma maneira deliciosa. Se misturaram sem perceber, se contagiaram um do outro, contaminaram-se da saliva que transbordava o corpo. Riram enfim.
Tocava o vinil Transa de Caetano, Ana se levantou, espreguiço seu corpo branco, procurou sua roupa no chão, se vestiu sem pressa enquanto Pedro a observava e sentou sobre a cama, beijou-lhe a boca e bagunçou seus cachos – Pedro, Pedro... depois disso foi embora. Quando a porta a bateu, Pedro sorriu, sentia o cheiro da moça em meio ao lençol, em meio ao seu corpo, era gostoso e isto bastava, a textura da pele dela agradava a pele dele, era isto e nada mais. Lembrou vagamente das poucas frases que trocavam, ela falou mais, ela tinha olhos bonitos, ela havia dito para Pedro que achava seus cachos bonitos.
O garoto dormiu cansado, depois de tanto, o corpo pedia sono. Acordou tarde, os amigos já em casa, dormiam nos lugares mais diversos do quarto. Levantou, colocou um casaco, fazia muito frio, apesar de ser bem magro, gostava daquela temperatura. Lavou o rosto, encarou a face de menino no espelho, sorriu com os olhos pequenos. Conferiu se tinha um trocado no bolso e foi andar sem rumo, em busca de qualquer lugar com café e cigarros. Gostava do vento que batia em seu rosto e da corrente elétrica que percorria seu corpo, sentia. O sol de Maio o deliciava. Talvez aquela poeira suspensa no ar estivesse se desintegrando aos poucos....talvez...Pedro sentia qualquer coisa, cansaço, que seja. Não era por causa de Ana, não era por causa de nada e tinha total certeza disso. Lembrou do sexo, do arrepio, e continuou com seus passos. Andou por um bom tempo, encontrou um bar antigo, azulejo azul, senhores jogando cartas. Apanhou um maço de cigarros e pediu um café. Sentou sozinho, buscou um guardanapo, pediu uma caneta para o senhor ao seu lado e começou a misturar palavras com traços, texturas com prosa, gozo com pele, desenhava letras e sílabas.

Sentia seu corpo - sentia seus ossos – sentia qualquer coisa. Pedro enfim, sentia.
A chuva veio atípica, quase enxergava a camada de poeira se desfazer.
Eu disse, quase.

Beijos, limão e mel
Ana T.

ps: postei sem ler! faz tanto tempo que não escrevo...que estou me deliciando com isso. depois,quem sabe, eu leia as frases mais atenta. que sabe...





terça-feira, 17 de abril de 2012

Ler ao som de: Meu Refrigerador Não Funciona

- O que houve? – Eu queria ter te conhecido na infância. - E por isso que você chora? – Quem disse que choro? – Queria uma foto nossa do tempo do colégio. – Nunca estudamos juntos no colégio. – Por isso disse que queria. – Eu tinha exatamente sua idade quando te conheci, Ana. – Não funciona. – O que? – Meu refrigerador. – Quebrou há quanto tempo? – Eu tentei de tudo, não funciona. – Às vezes não adianta tentar. – Te estranho assim. – Como? Pessimista. – Ando amargo. Atormentando. – Eu sei. São os tormentos atrofiados. – Essa história novamente! Não a suporto mais. Ela acendeu o cigarro e não disse nada. – Ana. A academia nos enlouqueceu. – Sempre achei isso. – Agora não acha mais? A fumaça invadiu a sala de jantar. Os pratos estavam vazios e mudos. Transbordavam ausência. Ela sorriu de lado. – Não entendo porque você sempre me diz que tinha minha idade quando me conheceu. – Nem eu. – Você me abraçou no meio da Avenida Paulista e me disse isso. – São apenas números. – São apenas coisas, coisas. Pequenas coisas. Consolos, repulsas. – Ana, você não me respondeu. – Eu sei. Ela bebeu um gole de vinho seco e continuou. – Não sei o que acho agora. Vago desde sempre. Tropeço entre tantos nervos atrofiados. Não sei, Pedro. Talvez a academia seja uma grande desculpa para eu justificar minha frustração. Pausa. Continua - Eu disse frustração? Que expressão terrível. Visualizo essa palavra em todos os livros de auto-ajuda. Transporte público, estação Sé, livro de capa azul com um bela rosa: Supere suas frustrações em cinco passos! – Tormentos atrofiados... – Nervos atormentados, atrofiados..palavras..cacos... – Ana, respira. – Não funciona. – Quando eu não encosto no teu corpo... – Você vive fora desse emaranhado quente. – Não quero sair – Não quero, nem consigo. É um laço que se faz com a pele, e se tento soltar, rasga meu corpo. – Estamos falando do que? Ana não disse nada, encarou seu rosto pálido no espelho. Só enxergava a si mesmo, Pedro não aparecia. A casa era escura, os móveis estavam empoeirados. – Ana, e se eu tentar apertar o laço? – Não funciona, Pedro. Não funciona.

Ana T.

segunda-feira, 19 de março de 2012

bichos

Os dois sentados na escada, ela fumava um cigarro, ele comentava o clima. O ônibus estava lotado, os olhos azuis do menino destoavam em meio a tanto cinza, ela lia Milan Kundera, e sorria para a criança de cabelos de anjo. Ele ouvia Tom Zé. Eles erravam as palavras, outros brigavam estáticos no trânsito, a moça reclamava das barbeiragens do marido. Luisa esfolava os joelhos pela segunda vez na semana. Chovia na Avenida São João. O garoto roia as unhas compulsivamente, Sabrina chorava escondida enquanto o namorado vendia seguros. Marcela e Carlos deitados na cama, ao som de qualquer vinil cortante, ela dormia, ele a observa incrédulo, - como podia ter passado tanto tempo? O estomago doía, os pensamentos desconexos, como sempre, como sempre. – Talvez dar um tempo. – Dorme dorme, meu pecado, minha culpa, minha salvação. Ele cantarolava Tom Zé. Eram dois bichos machucados, já não filhotes, perdidos e sem rumo, sangrando por ai. Dois bichos machucados, dois bichos zonzos dos mal tratos, cansados do caótico, do nojo e repulsa. Dois bichos machucados, dois bichos que se machucavam constantemente, um machucava o outro, o outro machucava um, abriam feridas, mordiam os arranhões, caiam no chão, rolavam, brincavam como dois filhotes, quase se matavam como dois adultos insuportáveis, pulavam e agora agonizavam na cama.

Dois bichos. Ana e Pedro. Dois bichos desesperados. Dois bichos (in)conformados. Cheirando um ao outro. Dois bichos viciados um no corpo do outro. Dois bichos que se mostravam ferozes quando um terceiro bicho se mostrava interessado. Bichos. Que sangram gritam mordem desesperados e agonizam em praça pública. Em silêncio e com toda discrição, querem manter as aparências. Afinal, são bichos. (?)



domingo, 11 de março de 2012

a waltz for a night

Ler ao som de Bilhetinho Azul - Cazuza

as pessoas são deliciosamente substituíveis.

só é preciso uma dose de tempo

outra, bem generosa, de cachaça

e uma garrafa de coragem.

e se quiser (para garantir o gosto amargo)

acrescente uma pitada de cacos de vidro

talvez

não precise de tanto

sou mesmo um pouco exagerada.

talvez, não precise de nada disso.

nada.

beijos cortantes


não. isto não é um trecho mesclado de culpas.

culpa. culta. culpa. de quem é a culpa? a culpa é de quem?

f0da-se

não tem culpado

existe por si só.

um beijo, bilhete, cheiro, caderno de química, qualquer coisa

some

mas fica.

e dói.

mas passa.

mas fica.

mas volta.

laço que se transforma em nó.

aperta. tortura, mas não mata.


agora rapaz

me faça um favor

esqueça a culpa,

por hora.


me da um abraço curto pra não sufocar

e cai fora de uma vez

pra não dar tempo

de te substituir