quinta-feira, 22 de abril de 2010

Relatividade?

Ela com febre, a voz já não existia mais, os olhares falavam sem pudores, o sorriso não conseguia sair dos lábios.
Já que eles não conseguiam se encontrar na realidade, inventaram uma dimensão própria, paralela e pouco conhecida.
A febre continuava, o medo e o nó na garganta pairaram entre os corpos dos nossos personagens, mas era preciso uma dose de adrenalina para eles, que vinha sempre acompanhado de um cigarro e uma grande movimentação das mãos.
Escuro, garrafas quebradas, que que é? Com o tempo, a melodia da situação embriagou os dois, extasiados, andavam rindo, olhando para o alto e dançando com as sombras de si mesmo, perdiam-se propositalmente, quanto mais distante da realidade monótona, melhor.
Sentaram, olharam toda aquela imensidão sem sentido, caótica, e enxergaram beleza, devanearam, relatividade, por que não? Passado, presente e futuro, em círculos, túneis de sensações, era como se tivessem sentados em um banco dentro de um trem, trem para as estrelas, trem que corria, diferentemente das conversas, que pareciam sem presa alguma, espelhos em toda parte, em todos os vagões, e através deles, nossos personagens enxergavam seus respectivos passados, atormentados com tantas lembranças, correram, procuravam pelo futuro, mas não encontravam, correram mais, não queriam ficar acorrentados a nostalgia, até que um espelho refletiu as personalidades delirantes de cada um, trocaram algumas palavras, poucas, quase sussurravam para o outro lado do espelho, pararam então de procurar um futuro estático, saíram correndo daquele trem, pularam no chão, caíram, e riram demais, estavam sem dúvida, colocando em prática o conselho dado, que consistia em escrever o próprio futuro, e ela escrevia, nas páginas em branco do corpo dele.
Acordaram deste delírio e já estavam em outro, tropeçando entre tantas loucuras, se beijavam com sede, se abraçavam por inteiro, riam, giravam...giravam...a noção de espaço estava totalmente conturbada, entre tantos giros, os lábios acabavam se encontrando, saíram dos círculos e com certa dificuldade, tentaram andar em uma linha reta, ah..fracasso!
Precisavam de água, álcool, andaram, acharam e ficaram muito tempo naquele conto, falaram sobre eu não sei o que: identidade, carteiras, sono, que que é? Mais um copo, mais uma garrafa, é a última, eu juro, vem mais perto, esse é o sorriso, que sorriso? Silêncio..silêncio, que delícia de som, rosto, traços finos, aranhões que arderiam durante toda aquele eternidade que durava frações de segundos.
O dia já dava sinais de vida, aquela sensação estranha pairava, de fim..final..saíram como sempre tropeçando em suas próprias loucuras, se beijavam como se só existisse aquele instante, e realmente, era fato, esqueceram que eram observados, se abraçavam com intensidade, aquele dimensão estava prestes a acabar, pelo menos desta vez, andavam abraçados, não queriam ir embora, ouviram frases sobre o amor, faladas por uma cigana que não tinha nada de dissimulada, riram, talvez ficaram um pouco envergonhados, ou não, era intenso, chegava a faltar ar, o lábio, a textura, o ouvido, o pescoço, era harmonia dentro de uma desarmonia, se jogavam na perde, mordidas, queriam um gramado, acharam um gramado, fizeram um gramado, deitaram, era surreal, olharam os prédios de uma maneira tão diferente, a grama era macia, ela deitou no ombro dele, era onde ela queria estar, e sabe? Acho que ele também.
Os ponteiros insistiam em correr, e eles insistiam em ignorar, voltaram ao começo, deitaram, dialogaram entre os olhares, e foram em busca de novos cacos da garrafa quebrada, o parque..ah..o parque...as cores, as árvores, ela nunca tinha ido até lá, a luz era serena, a mescla do verde com amarelo, pessoas caminhando, fazendo seus alongamentos estranhos, eles riam, riam de si mesmo, do estado físico em que se encontravam, as pernas bambas, o corpo pedia descanso, sentaram em um banco, ele deitou no colo dela, era tudo tão surreal como aquela simetria daquele rosto, beijos concretos e subjetivos, faltava o ar, faltava a razão, e transbordava a insanidade de desejos aleatórios, ela não queria ir embora, queria ignorar todas aquelas pessoas, queria aquele êxtase momentâneo, senti-lo até as ultimas conseqüências.
Os gatos, a ração espalhada, a senhora que poderia ser uma bruxa, a percepção era toda muita intensa, eles abraçados, leves, driblando o cansaço físico por mais alguns instantes de proximidade, ele queria dormir ali, ela tentava ser racional, boba, boba, a realidade esperava por eles, saíram ao encontro dela.
O contanto físico com o passar do tempo, era cada vez mais forte, a coreografia das mãos, dos lábios e dos olhares eram poesias, deram boa dia aos espelhos, não seguiram ordem cronológica, se esconderam do sol, queriam fugir do dia que nascia, mas não conseguiram, não adiantava correr.
Transportes públicos, ela mudou de lugar, ele deitou no ombro dela, ela não largava as mãos dele, beijou seu rosto e seus olhares, era o caminho para a distância, saíram daquele trem sem espelhos, sem passado e sem futuro, andaram sem força, era informação demais, pessoas andando sem tanta presa, barulhos aleatórios, cores e sensações, as mãos não se soltavam, os olhares não se perdiam.
Sentaram em mais um banco, era o último, ela quem deitou no ombro dele, e dormiu, cochilou, por menos de vinte minutos, acordou com o coração disparado, olhou para o lado e percebeu que não se tratava de um sonho, sorte..eles conversaram não sei bem sobre o que, acho que nem os próprios sabem, creio que falaram mais em silêncio, trocaram segredos secretos entre olhares, se abraçavam, se beijavam, frases impulsivas, eu gosto de você, eu também, não quero ir embora, não quero que você vá, era poesia, poético, cinema, melodia, sono, alucinação e delírio.
Eu cuido de você, eu não preciso que cuidem de mim, todo mundo precisa um pouco, ela dizia..ela sabia, como ela sabia... desde um passado não tão distante em que ele apertou a mão dela com força, como se pedisse para ficar, ela nunca enxergou naqueles olhos uma frieza, uma pessoa fechada em seus próprios medos, ela via loucura com pitadas de ternura.
Não se meche nas carteiras alheias, pena que ela não entendia, excessivamente curiosa, não sei como, criaram forças até para brincar, ele segurava os pulsos dela, e ela se desconcertava com a textura da pele dele,temos que ir embora..
Levanta, se abraçam, o corpo gritava, os lábios beijavam, desceram as escadas, e ele abraçou como da primeira vez, primeira vez, aquela que nem outra dimensão era, abraço com o corpo inteiro, com a alma inteira e com a essência plena.
Plenos, aquilo era ser pleno, o abraço quase a sufocava,um fluxo de pensamentos gritava em silêncio, sussurrava em seus ouvidos todas aquelas lembranças tão recentes de um passado que não poderia ser estático, as cores, os beijos, as risadas sem presa, deitar em você, girar, girar, relatividade, dimensões, personalidades, álcool, desejo, textura, pescoço, me arranha, teus ouvidos me tirando a concentração, você me chamando de louca, sem razão, sem pudor, assim como teus beijos, vontade de ficar mais um dia, de sumir com você, te levar pra longe dos olhos alheios, sem ar, com a roupa rasgada, gira, sente e acaba.
Ele saiu, ela também, era engraçado porque agora o sem sentido era estar sozinha, sem ele por perto, sem a sua doce dose homeopática de insanidade lúcida, agora era sem lógica, andou com pressa e sem força, escutava as conversas, assistia todo aquele filme sem direção, via os atores e o cenário quebrado, acabou a sessão e a vontade de escrever.
Ana T.

Foto:Achada no google, aleatória!
[Os filmes alheios me inspiram!]
Câmbio/Desligo.

Um comentário:

Poeta dos Olhos Lindos... disse...

Tudo! Não tenho como expressar de forma diferente, o que esta descrito á cima. Lendo, eu me senti com a mesma gama de sensações. Era algo que me trazia um vazio preenchido de tudo o que eu queria nao suportar. Sensações essas, que me levaram a este mundo paralelo, mundo que a tempos vivo. Vivo nessa constante loucura sã dentro de mim. Sanidade louca, tão bem retratada á cima. Belo Post pequena, belo post minha prima.