todo menino criança sapeca olhando pros lados e pra baixo e sorrindo sorrindo com seus dentes bonitos
todo magrinho correndo de um lado pro outro caindo sujando a roupa arranhando os joelhos ralando o cotovelo
todo perdido nessa multidão todo perdido por ter se achado em si se achado tão diferente
os dois brincavam rolavam na grama juntos subiam em árvores roubavam amores amoras lírios flores de lírio delírios morangos qualquer fruta madura roubavam pipas coloridas dominós cartas de papel riam riam rodavam
giravam entre estrelas maduras e cometas giravam entre cachos e elos azul e amarelo
gargalhadas de sol
os dois se experimentaram
mesclados misturados
pele gosto
fruta fresca
matar a sede na saliva
e a fome na carne
correram pra assistir o sol indo embora
o lugar era tão alto
até os passarinhos destilavam medo
voaram alto
muito alto
os dois
às vezes olhavam pra baixo
tontura tortura
labirinto
sem medo do tombo
sempre esfolavam os joelhos
era só um pouco de sangue
deitaram na grama
o céu estava lindo
imensidão infinito
roupas rasgadas
sujas
gostos mil
cheiros
ela fazia do abstrato palpável
ali
tocando a pele dele
ele suspirava respira expressava
dormiram enfim
de qualquer jeito de um jeito qualquer
ele a abraçava
ela inquieta
mas gostava
queriam ficam mais próximos
mais próximos
outro dia outra noite outro amanhecer
qualquer coisa
que seja
já faz tanto tempo que eu não me lembro
eram tão novos
tocava Caetano trem das cores
outro dia
na pele gosto sexo nicotina terra poeira poluição saliva
falas justificativas histórias amores mancha de amora
doses de tristeza insegurança
doses generosas de leveza alegria que derrete desmancha na boca oscilações térmicas
estavam estáticos
tragando um o olhar do outro
já que o cigarro havia acabado
a boca estava seca
água caindo percorrendo a pele
gostaram da idéia
correram
sol da manhã entrava pela fresta da janela
estava atrasados
ah rotina
nem ligavam
riam riam sem parar
ele olhou desconfiado
ela nua
página em branco
- espera, nós só sabemos fazer coisas que nos sujam…e agora vamos…sabe…tirar…limpar…isso é estranho.
parecia que ele tinha medo da água roubar deles aquela ternura roubar deles tudo aquilo nada daquilo roubar a alma roubar um do outro ele de si mesmo
ela ria…ria da expressão das falas..ria…crianças. não me lembro bem o que ela falou..talvez tenha sido algo – água caindo no corpo…água é energia em movimento, vida…vem…
estendeu a mão e ele sorriu
água corpo pele riam muito muito beijos entre gotas e risos ternura vontade
se abraçavam se afastavam – deixa eu lavar o seu cabelo!
a luz tão bonita, céus, quanto tempo faz...luz de sonho bom. ai ai que saudade faz tanto tempo
depois ou antes não sei não lembro detesto ordem linhas cronológicas
ele fez café ali na cozinha, ela sentada na cadeira observando seria sonho? devaneio delírio fantasia…ele ali todo menino procurando açúcar filtro e ela não sabia bem onde ficavam as coisas ela não sabia bem onde ela estava
esperaram o café ficar pronto jogados no sofá, fazia frio, janela aberta
uma gata aparece desconfiada silêncio
ele destila um olhar pra bichana
[eu quase consigo tocar esse olhar – um fio invisível e eterno]
a gata desvia
um carinho quase de longe um carinho nada efusivo um carinho dele um carinho leve
gata desconfiada, ela se afasta
carinho
ele esboça um sorriso
[eu consigo tocar esse sorriso]
a gata encosta a cabeça em suas pernas cruzadas
os olhos dele quase se fecham, tão pequenos
carinho da gata carinho dele
a gata se afasta
luz linda
aquele cheiro pairando era o dia que começava
canecas cigarros varanda amanhece
diálogos
falares
ela arruma a cama
ele joga seu corpo leve
ela sorri fingindo de brava
ele a puxa pela cintura
quem dera se pudessem procurar por mais frutas maduras
as despedidas deles são eternas
nunca é uma despedida
elas não existem
são farsas
esquece carteira
cachecol
leva a blusa no corpo
toalha escova de dente
qualquer coisa
esquece o que não é dela
dele
esquece um cacho
outra textura
estou quase como eles
levantaram sei lá quando
esqueceram mil coisas
voltaram
o espelho os encarou
crianças
sapecas
apagaram a luz
bateram a porta
ela esqueceu de trancar
e saíram
cada um para um lado
mentira
beijo da Ana T.
segunda-feira, 12 de setembro de 2011
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Um comentário:
mas que lindo isso, isso tudo
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