- Abril acaba nessa sexta.
- Quando terminarmos a rua, nos separamos.
- Ainda não nos cansamos um do outro.
- É pouco tempo.
- Três semanas.
- Não era um mês?
- Não vejo defeitos.
- Vícios inofensivos, literários.
- Vou te ligar pra saber como foi seu dia.
- Não quero que você me conheça.
- É. Acho que não quero saber dos teus anseios.
- O que você fez na tua mão?
- Queimei com o isqueiro.
- Proposital?
- Talvez.
- Você já namorou?
- Com você, hoje faz três semanas.
- Um mês, digo...além de mim.
- Nunca.
- Nunca ficou bastante tempo com alguém?
- Você quer saber do meu passado? Quer outro cigarro?
- Sim, obrigada. Eu gosto de imaginar as pessoas vivendo suas vidas...em outras esferas, relações cotidianas.
- Acho que o máximo foram três meses.
- Os defeitos já gritavam?
- Eu gosto da empolgação.
- Tá com frio?
- É que esse chão tá gelado.
- Vamos levantar.
- Não, não precisa.
- Vem!
- Como você sabe que eu to com frio?
- Porque eu sinto teu corpo tremendo.
- Você é estranha.
- Você quem é.
- Eu gosto.
- De ser estranho?
- De você estranha.
- O jeito como as pontas dos seus dedos tocam meu rosto.
- Gosto do cheiro misturado, pele e cigarro.
- Eu também. Fica aqui oh...
- É.
- Queria outro cigarro.
- Tem outro aqui...ai..acabou.
- Ficou o cheiro na ponta dos dedos.
- A rua está chegando ao fim.
- É, eu sei. Mas o meu cheiro vai ficar em você.
- Pena que é só o cheiro.
- Todo essa movimentação..vicia.
- É...puxar o cabelo, suspirar, respirar, sentir a língua desmanchando na boca.
- Um tango em silêncio.
- Você me faz sentir frio e calor ao mesmo tempo.
- Meu ombro é um dos pontos fracos.
- Eu percebi.
- É...acho que é isso.
- Você volta? Ai..olha eu querendo controlar tua vida.
- Claro que eu volto. Sem justificativas por hoje.
- Sem achares. As crianças que vivem.
- Espontaneidade.
- Te imagino jogado no chão brincando com criança.
- É! É isso mesmo.
- Experimentações libertárias.
- Oi?
- Nada. Eu falo demais.
- Talvez.
- Viu, vou-me embora.
- É, a rua acabou.
- E a empolgação?
- Continua.
- Tem gente que prefere terminar no ápice.
- Eu prefiro morrer de intensidade.
- Lembrei-me de “Cleo e Daniel”.
- Todas pessoas olhando pra gente, julgamentos, pudores, ódio.
- Falta de sexo.
- Falta tesão.
- É. Sexo tem muito.
- Pânico de tédio
- Monotonia me assusta.
- Me envolve com tantas coisas, mas não me concentro em nenhuma.
- Correntes elétricas percorrem o meu corpo inteiro. Agora. Com você.
- Minha pele na tua.
- Preciso ir.
- Então vai.
- Volta.
- Cuida desse resfriado.
- Eu cuido.
...
Inspirado no filme "Eu, você e todos nós" - e não só.
Nenhum comentário:
Postar um comentário